quinta-feira, 19 de abril de 2012

Sem Mais



Aquela tensão em esperar, vigiar os ponteiros do relógio para que eles não trapaceiem, enquanto a distração vez e outra se atenta para flertar com a rua – os carros que passam, as pessoas que se atropelam, o vento varrendo o dia que ficou nas calçadas. Aquela tensão em mastigar o vazio do tempo que não quer correr, que não quer partir e deixar-me em outros braços.

Aquele medo de encontrar-se com o Nunca Mais, com o rumo que a vida leva, e nos leva, involuntariamente... Medo de passar as mãos pela cama, e não encontrar o calor de uma pele que não a minha. Medo de não mais partilhar de risos e sussurros fora de hora, fora de eixo, fora de qualquer sentido racional.

Aquela velha angústia no aguardo que nunca finda - correr a vista pela casa, tatear a ausência, a escuridão que entra pelas frestas, como ratos famintos numa fome insana. Aquela angústia em suportar o encarar incessante das paredes que nunca falam, mas ouvem, sempre ouvem e muito atentas.

Aquela ânsia em devorar o incerto, o silêncio que não cala, as lembranças quase insustentáveis... Ânsia em corromper-me em teus beijos, impregnar-me com teu cheiro, embrenhar-me em teu pêlo, em teu selo, em teu corpo em ebulição.  Ânsia em devorar-te, sem mais. 

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