domingo, 29 de abril de 2012

Eu Comigo





Muito briguei eu comigo,
tive raiva,
me insultei.
E, de incontido desgosto,
em meu próprio ombro chorei.

Murro em Ponta de Faca




Nunca Mais poderei sair do meu lugar
(Comigo dentro, o mundo e a alma em igual situação).
Para sempre. Eternamente:
Escreveu-me Deus.
(Enquanto houver ser, eu não sairei de mim). 



O Retrato Fiel





Não creias nos meus retratos,
nenhum deles me revela,
ai, não me julgues assim!

Minha cara verdadeira
fugiu às penas do corpo,
ficou isenta da vida.

Toda minha faceirice
e minha vaidade toda
estão na sonora face;

naquela que não foi vista
e que paira, levitando,
em meio a um mundo de cegos.

Os meus retratos são vários
e neles não terás nunca
o meu rosto de poesia.

Não olhes os meus retratos,
nem me suponhas em mim.


sexta-feira, 20 de abril de 2012

Imensidão


Quero ver o mar,
Pôr os pés na água,
Caminhar...
Quero sentir o vento emaranhando o cabelo;
O sal embrenhando na pele;
O frio arrepiando o pêlo...
Quero sentir a areia fina tocando os dedos;
Embebedar-me com o céu confundindo-se ao mar,
Os pássaros invadindo seus segredos...
Eu quero ver o mar,
Mergulhar,
Deixar as mágoas  por lá...


Rayane Medeiros




 


quinta-feira, 19 de abril de 2012

Sem Mais



Aquela tensão em esperar, vigiar os ponteiros do relógio para que eles não trapaceiem, enquanto a distração vez e outra se atenta para flertar com a rua – os carros que passam, as pessoas que se atropelam, o vento varrendo o dia que ficou nas calçadas. Aquela tensão em mastigar o vazio do tempo que não quer correr, que não quer partir e deixar-me em outros braços.

Aquele medo de encontrar-se com o Nunca Mais, com o rumo que a vida leva, e nos leva, involuntariamente... Medo de passar as mãos pela cama, e não encontrar o calor de uma pele que não a minha. Medo de não mais partilhar de risos e sussurros fora de hora, fora de eixo, fora de qualquer sentido racional.

Aquela velha angústia no aguardo que nunca finda - correr a vista pela casa, tatear a ausência, a escuridão que entra pelas frestas, como ratos famintos numa fome insana. Aquela angústia em suportar o encarar incessante das paredes que nunca falam, mas ouvem, sempre ouvem e muito atentas.

Aquela ânsia em devorar o incerto, o silêncio que não cala, as lembranças quase insustentáveis... Ânsia em corromper-me em teus beijos, impregnar-me com teu cheiro, embrenhar-me em teu pêlo, em teu selo, em teu corpo em ebulição.  Ânsia em devorar-te, sem mais. 

sábado, 14 de abril de 2012

Mudo, logo existo.



Sabe, sou terrivelmente mutável. Bom, o espírito ao menos. E fico querendo revirar a vida, os hábitos, os vícios... Terrivelmente, porque na maioria das vezes são tentativas falhas, e ainda que mude a vulnerabilidade, ou inclinação às mudanças, sempre me levam ou a retroceder, ou querer sempre o Novo; nada irá me aquietar, sou uma constante.   E cá fico eu agoniada, esperando que o extraordinário me aconteça. Mas já dizia o Raulzito “Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. Mudo como o vento errante, as fases da lua, o mar que nunca sossega, os pássaros afoitos no ar... Mudo, porque sou feita de inconsequências, ações não determinadas, desejos inconcebíveis. Mudo, porque é no agir que eu me faço Ser. 

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Vadio


Converto-lhe, meu senhor,
À minha religião,
A este paganismo desnudo,
À doutrina apedrejada por esta hipocrisia barata.
Converto-lhe, senhor,
A estes vícios infindos
Este abismo salobro que te engole e
Te cospe em desalinho.
Converto-lhe, ó senhor,
Ao paraíso de ser vadio,
De ser livre em demasia;
Pois se do pecado vim,
Do pecado viverei.


Rayane Medeiros

domingo, 1 de abril de 2012

Verme




Palavras,
Indo e vindo à contra mão;
Que não querem materializar-se,
Descrever-me o espírito,
A alma em inconstância,
O discurso não dito.
Palavras,
Esse vício que nos embebeda e quando ausente,
Deixa-nos a vigiar os ponteiros do relógio;
Que não verbaliza o vazio dos que nada esperam
E nada tem a perder.
Palavras,
Este verme desregrado. 


Rayane Medeiros